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domingo, 23 de outubro de 2011

Dia 4 | 23out | Cambodja - Dia pesado mas fundamental, as feridas do Khmer Vermelho

Hoje saimos cedo com o tuk-tuk (uma moto tipo 125cc puxando uma espécie de carroça, muito popular em vários países do sudeste asiático), aliás com um cara bem legal chamado Luke. Passamos num lugar para trocar um pouco de moeda. Aliás, aqui no Cambodja até brasileiros como a gente podem se sentir milionários - 1 real equivale a cerca de 2000 riels. Mas aqui a moeda corrente para turistas é o dólar, o que também ajuda a identificar os lugares focados em turistas. Pedi ao Luke para nos indicar um local para tomarmos nosso café, mas que fosse frequentado pelos locais. Aqui o povo come arroz ou macarrão no café. Fomos a uma casa de noodles, de aspecto parecido com as casa chinesas que têm na Liberdade, tipo Campeão (ou seja, não era um lugar dos mais bonitos), mas que estava cheia e com o povo local comendo com entusiasmo. Pedimos 2 noodles, com macarrão de arroz, broto de feijão e porco, uma delícia! Tinha um tiozinho do lado que ainda nos ajudou a misturar os temperos e pimentas, o que deu ainda uma melhorada no prato. Essa foi uma experiência bem "Anthony Bourdain" (ref ao programa No Reservations, da Discovery Travel), autêntica e muito boa!
Outra coisa que é bem curiosa (mais uma para a seleção "coisas pitorescas") é que passamos por umas 3 ou 4 festas que são feitas no meio da rua, como um almoço de casamento. Eles colocar umas grades, fecham metade da rua e enfeitam com uma faixas e tecidos e pronto!! Está feito um espaço p o buffet!! O engraçado era que em uma dessas (essa não deu p tirar foto) os convidados tinham que atravessar a rua para ir de um salão a outro!

 Nós à bordo do tuk-tuk, noodles autêntico e delicioso, a festa no meio da rua e o Luke, nosso motorista.

Após o café à cambodjana, fomos a um lugar chamado Killing Fields (ou Campos de Matança) de Choeung Ek e depois ao Museu Toul Sleng. Estes dois lugares são o testemunho das feridas deixadas pelo governo de Pol Pot, líder do Khmer Vermelho (Khmer Rouge), que instaurou a República Democrática de Kampuchea, entre 1975 e 1979. O domínio de Pol Pot nesse curto período ajuda a compreender o país hoje: durante seu governo, milhares de pessoas (entre homens, mulheres e crianças) foram  assassinadas (no Lonely Planet se menciona mais de 2 milhões, e no museu, quase 3 milhões). O ideal do Khmer Vermelho era promover uma sociedade democrática agrária, e a partir desse "ideal" se estabeleceu o "Ano Zero". A partir de 1975, absolutamente TUDO que se referia a qualquer herança cultural khmer (khmer se refere ao povo cambodjano, a sua origem) e ao mundo capitalista deveria ser banido. Para isso Pol Pot promoveu um genocídio que começou com todas pessoas com algum nível de instrução (jornalistas, artistas, médicos, professores, etc), a moeda foi banida, várias edificações foram demolidas (universidades, bancos, teatros, templos, etc), religiões fora banidas. O país experimentou um retrocesso a uma sociedade agrária primitiva, onde o que imperava era o trabalho forçado nos campos.

Creio que a sensação dessa visita seja equivalente a uma visita ao campo de concentração nazista de Auschwitz. Um dia pesado, onde a gente tem uma pequena noção do que essa gente passou. O que mais impressiona é que isso aconteceu há menos de 40 anos atrás. Famílias inteiras foram extintas, e hoje a relação de parentesco é algo que se valoriza muito no país, pois depois da presença do Khmer Vermelho as pessoas tiveram que reunir os laços que restaram, e isso inclui primos de segundo grau, por exemplo.

Killing Fields de Choeung Ek

Começamos a visita pelo Killing Fields, mas creio q a sequência lógica era começar pelo museu Toul Sleng. Os Killing Fields, ou Campos de Matança, eram áreas reservadas com o único propósito de exterminar as pessoas julgadas pelo regime, o que incluiu homens, mulheres e crianças. Houveram mais de 300 durante o regime e o de Choeung Ek é o mais conhecido. Foi erguido num antigo cemitério chinês, a cerca de 14km do centro de Phnom Pehn. Logo na entrada, vimos o enorme relicário, construído em estilo Khmer, que presta homenagem às pessoas mortas durante o regime. Esta torre, com uma estrutura em vidro e concreto abriga os restos de cerca de 9000 pessoas, entre crânios e outras partes. Uma cena realmente impressionante, que nos faz perguntar como isso foi possível, como Pol Pot conseguiu persuadir seus subordinados a cometer crimes tão assombrosos. No entorno, as covas coletivas onde foram encontradas cerca de 17mil ossadas após a exumação feita em 1980. Mulheres e crianças foram assassinadas com crueldade inimaginável, esse pessoal do Khmer Vermelho realmente estava impregnado de uma motivação insana, bárbara. Depois vimos um filme documentário que nos dava a dimensão do que acontecia lá dentro.
Foi um passeio pesado, a gente vê reações diversas nas pessoas que estão lá visitando, mas é fundamental para compreender um pouco o país e suas pessoas.

O relicário com os crânios de cerca de 9000 pessoas, e sua vista externa. Abaixo, a vista geral do entorno com as covas coletivas e por último uma cova onde foram encontradas somente crianças.
 
Museu Toul Sleng (conhecido como S-21)

O museu Toul Sleng se localiza numa escola que foi ocupada pelo Khmer Vermelho para abrigar o centro de detenção e tortura. É estranho ver um prédio de uma escola, onde antes crianças e jovens corriam pelos pátios e salas de aula, se transformar num espaço de terror. As salas foram adaptadas para receber todos "acusados", "suspeitos" e "traidores do regime", o que poderia ser qualquer um. As pessoas eram trazidas, torturadas e depois enviadas para serem assassinadas nos Killing Fields. Nem tiramos muitas fotos aqui, o lugar dá arrepios, tem um clima realmente pesado. Nos painéis vimos fotos de um ator e uma cantora, famosos na época, que foram também assassinados.


Vista geral do prédio, detalhe da cerca para evitar suicídios, expo de fotos sobre os campos e a exumação de 1980, vista de um dos quartos.

Um aspecto que ainda nos choca é saber, através dos guias locais e também de depoimentos (no YouTube tem um episódio do No Reservations sobre o Cambodja, de 2010), que ainda há membros do Khmer Vermelho ocupando posições privilegiadas na sociedade cambodjana. Corrupção e impunidade, será que isso lembra de algum outro lugar?

A presença de turistas aqui em Phnom Pehn é algo impressionante, não esperávamos ver tantos aqui, de várias nacionalidades, europeus variados, americanos, chineses, thailandeses, mas nenhum brasileiro por enqto. Por um lado, é muito importante para o país se tornar um destino popular, pois sua história recente demanda uma entrada de dinheiro, trazendo recursos que ajudem na sua reconstrução. Já vimos algumas universidades pelas ruas, prédios comerciais, o turismo é crescente, Angkor Wat (onde iremos depois de amanhã) é um orgulho nacional. O país parece se reerguer após esse período de retrocesso, e isso inspira muita simpatia em todos que vêm visitá-lo.

Apesar dessa história recente tão pesada e cheia de feridas profundas, só tivemos experiências positivas com as pessoas que encontramos aqui em Phnom Pehn. Desde o tiozinho que ajudou a localizar a mala da imigração, os 2 motoristas de tuk-tuk, os vários tuk-tuk´s que nos abordavam nas ruas, as senhoras do mercado onde tentavamos perguntar algo sobre a fruta e o prato tal, o carinha do hotel que vive conversando sobre assuntos diversos com a gente, todas essas pessoas têm uma simpatia e abertura que realmente impressionam, chegam com um sorriso em que não sentimos traços de malandragem. Eles são em sua maioria budistas, o que talvez justifique essa forma de lidar e encarar a vida, apesar desses traumas tão terríveis por que passaram.


Enfim, Phnom Pehn nos cativou! 
Abs a todos!!

6 comentários:

  1. Há um tempo atrás eu li que frequentemente os familiares dos mortos e desaparecidos vão até o Museu Toul Sleng (S-21) prestar homenagem a eles através daquelas fotos de identificação tiradas pelos fotógrafos do regime e que hoje ficam expostas. Achei muito triste!

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  2. Essa área das fotos é bem triste mesmo Shi. O que achei curioso era q algumas pessoas estavam sorrindo, talvez ainda não tinham consciência do que ia lhes acontecer. Bj!

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  3. Marcio e Beth,

    Para marinheiros de 1ª viagem, o blogger está excelente,vocês estão caprichando nas riquezas de detalhes.
    Parabéns.

    Abraços.

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  4. Ge e Paulo,
    Legal que vcs estão acompanhando... Aqui realmente é diferente de tudo que já vimos mesmo... por isso dos detalhes, rsrs

    Abs bem forte!

    Beth e Marcio

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  5. Nossa, que loucura!!!
    Estou adorando a viagem de vocês e, sinceramente, aprendendo um pouco de história e geografia! rsrs
    Impressionante esses Campos de Matança, hein! Daqui senti o peso do lugar... fiquei imaginando o que vocês sentiram!
    Mas, como sempre digo, tudo vale a pena, não?!?!?! Cada viagem, uma experiência e milhares de conhecimentos!
    E, para finalizar, vocês serem bem tratados pelas pessoas daí, nada mais é do que a reação da ação - vocês são simpáticos e felizes, atraem pessoas do mesmo perfil!
    Beijos!!!

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  6. Oi Eiko!!
    Pois eh, nós tb estamos aprendendo a cada dia...
    Tem um andar neste colégio que não tivemos nem coragem de tirar fotos de tão deprimente que era, dava arrepios..
    Como vc disse, td vale a pena e como vcs, que gostam de viajar, acumulamos experiências de todas as formas... Valeu!!
    bjs!!!!!

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